quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Uma lição sobre cidadania: Djalma Cabral nos conta um pouco de sua história...

Durante a entrevista, o Sr. Djalma
compartilha conosco sua história...
Manhã de sábado, nesse abafado fevereiro. Seguimos para a residência do Sr. Djalma de Souza Cabral, a fim de reconhecermos e catalogarmos mais um pedacinho da história viva dessa cidade. Por volta das 10h da manhã, fomos recebidos pelo Sr. Djalma que, colaborando com o nosso trabalho e consciente de seu papel político, teve o cuidado de separar e nos permitir acesso a algumas fotografias que ilustram essa trajetória de luta.
Nascido no interior do estado do Pará, em 1945, o Sr. Djalma teve uma infância difícil. O pai faleceu quando ele contava apenas um ano de idade. As oportunidades eram poucas na cidade de Altamira, distante cerca de 800 Km da capital, Belém. Segundo o Sr. Djalma, ele crescia imaginando as grandes cidades, das quais sua mãe lhe falava: Fortaleza, Recife, Salvador... Aos 11 anos sua vida deu uma guinada (a primeira de muitas): a família conheceu o sertanista Francisco Meirelles, que viajava em expedição do SPI (Serviço de Proteção ao Índio, extinto em 1967, dando lugar à atual FUNAI) ao longo do Xingu. Acompanhando a expedição, o Sr. Djalma travou grande amizade com Meirelles e seu filho, José Apoena, que tinha, aproximadamente, a mesma idade que ele. Foi o sertanista Franscisco Meirelles, o responsável pela primeira vinda do Sr. Djalma ao Rio de Janeiro, nessa mesma época.
Todavia, como observou o Sr. Djalma em seu depoimento, enquanto esteve no Rio de Janeiro, entre os 11 e os 16 anos de idade, não se adaptou à cidade. Nas suas palavras, sentia-se como "um peixe fora d'água." O objetivo de estudar e se estabelecer na grande cidade ia ficando cada vez mais distante e o Sr. Djalma resolveu retornar ao Pará. De volta a sua terra, trabalhou no campo e também como seringueiro. Foi nesse período que, segundo seu relato, começou a se interessar pela questão agrária na região, tendo ingressado em um grupo jovem da Igreja Católica. A acumulação fundiária e a premência de uma Reforma Agrária já eram, então, assuntos polêmicos que desencadeavam sangrentos conflitos na região.
Sr. Djalma Cabral, junto aos
companheiros de luta na ASUFRJ.
Entretanto, mais uma vez, a vida do nosso entrevistado daria uma guinada: com o falecimento de sua mãe, o Sr. Djalma resolve, mais uma vez, tentar a vida no Rio de Janeiro. Nessa época, ele já contava 18 anos de idade. Pela segunda vez na cidade, ele relata ter tido diversos empregos: trabalhou em restaurante e lanchonete, hotel e fez até faxina em apartamentos para poder se manter. Dessa vez, procurou uma escola pública onde, à noite e com grande esforço, concluiu o que hoje compreende os Ensinos Fundamental e Médio. Em 1966, ingressou no Serviço Público Federal, atuando como Técnico em Laboratório na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Esse emprego o motivaria, mais tarde, a fazer o Curso Técnico em Química e assinalaria, também, o início do engajamento político do Sr. Djalma, no Rio de Janeiro. De fato, mesmo com o Brasil vivenciando o clima de medo e repressão do Regime Militar, ele fez parte da ASUFRJ (Associação de Servidores da Universidade Federal do Rio de Janeiro), que se transformaria depois no SINTUFRJ (Sindicato dos Trabalhadores em Educação da UFRJ).  Sobre esse período, ele narra as lutas da categoria, nos revelando um forte censo de cidadania.
Na vida pessoal, foi também nesse período que o Sr. Djalma Cabral conheceu sua esposa, a Dona Maria José. Nessa época, o custo de vida em Ipanema, bairro da Zona Sul do Rio de Janeiro onde moravam quando se conheceram, tornava-se cada vez mais alto e o casal, após morar em Botafogo e São Cristóvão, decidiu se mudar para Queimados. Sobre Queimados, nos idos de 1977, o Sr. Djalma diz: "era um lugar pequeno, provinciano..." Ele ainda destaca as precárias condições do antigo Segundo Distrito de Nova Iguaçu, ao lembrar que pouquíssimas ruas eram calçadas naquela época, o saneamento era praticamente inexistente e que o transporte público se restringia ao trem. Ao estabelecer sua residência no Bairro Aliança (antigo Campo da Banha), logo se evidenciou por sua atuação política à frente da Associação de Moradores, reivindicando melhorias para o bairro.
O Sr. Djalma (à direita): a experiência sindical, acumulada
durante anos de lutas, foi fundamental na organização
comunitária dos moradores do antigo bairro Campo da Banha.
Em 1985, filiou-se ao PT-Queimados, coroando essa história de intensa atividade política. Também participou da fundação da Rádio Novos Rumos, na qual chegou a estar a frente do programa Domingo Maior, e das reuniões que postulavam a necessidade de emancipação queimadense. Sobre o processo emancipacionista, o Sr. Djalma afirma que, no primeiro momento (o plebiscito frustrado, em 1988), houve um trabalho de mobilização popular sobre "o por quê emancipar?", embora ainda fosse muito controverso os limites "do que iria se emancipar?" No entanto, no segundo momento em 1990, nosso entrevistado nos fala de um trabalho mais consciente, que se pautava em limites físicos e identitários mais definidos. Da emancipação para os dias de hoje, ele acredita que a cidade vem experimentando um desenvolvimento bastante significativo, embora faça questão de salientar as "consequências", nem sempre positivas, desse crescimento...
O Sr. Djalma, entre os Srs. Carlos Albino e Ivan Calais,
candidatos a prefeito e vice-prefeito, respectivamente,
no pleito de 1996, pela coligação PT/PDT.
Ao final da manhã, nos despedimos do Sr. Djalma Cabral certos de termos conseguido trazer à tona mais uma história de vida que contribuiu para a construção da cidade de Queimados. A esse, que era nosso objetivo inicial, acrescentamos o exemplo que sua atuação política e a sua consciência de cidadania representou para o nosso trabalho. O historiador José Murilo de Carvalho afirma que "percorremos um longo caminho, 178 anos de história do esforço para construir o cidadão brasileiro. (...) Os progressos feitos são inegáveis mas foram lentos e não escondem o longo caminho que ainda falta percorrer." (CARVALHO, 2001: 219). Ao concordarmos com essa afirmativa, registramos aqui nossos sinceros agradecimentos ao Sr. Djalma por, ainda que involuntariamente, nos ter levado a uma (sempre bem vinda) reflexão sobre nosso trabalho. Acreditamos que, quanto mais consciente de sua história for a população, mais consciente ela também estará, acerca do pleno exercício de sua cidadania.

7 comentários:

  1. Olá, boa atarde!
    Meu nome é Djair de Souza Cabral, filho caçula do senhor Djalma de Souza Cabral e da dona Maria José Silva Cabral e gradeço muito a Deus pelos pais que eu tenho. Sou feliz e honrado pela vida que eles me proporcionaram. Meus pais vieram de uma classe muito sofrida, mais sempre foram lutadores e nunca desistiram das batalhas árduas que a vida lhes proporcionavam, mais Deus ajuda quem trabalha. Amo minha família!!!

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  2. Olá, boa noite,

    Primeiramente, gostaria de agradecer e parabenizar esses dois grandes historiadores, por dizer aqui parte da história do meu pai, como meu irmão disse, meus pais vieram da classe mais sofrida do Brasil, juntos, lutaram e conquistaram várias batalhas e graças a Deus, eu pude acompanha-lo desde criança, entre protestos, assembléias, reuniões políticas e até o movimento das "Diretas Já".
    Meus pais são motivo de muito orgulho para nossa família e exemplo para muitas outras. Amo minha família e mais uma vez, agradeço ao amigo Nilsinho e sua amiga pela matéria, nos emocionou bastante.


    Atenciosamente,

    Djalma de Souza Cabral Júnior

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  3. Boa noite,
    Sou Maria José da Silva Cabral, e agadeço a Deus pelo marido e dois filhos maravilhosos que ele me deu. Eles são a maior riqueza que uma pessoa pode ter, sou a mãe e esposa mais feliz do mundo. Muito obrigada aos historiadores pela matéria e obrigada Djalma por me proporcionar esta felicidade.

    Te Amo !

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  4. Quero parabenizar aos historiadores pelo trabalho maravilhoso de resgate da memória queimadense e, em especial, pela entrevista com essa pessoa muito querida que é DJALMA CABRAL, companheiro de lutas e de sonhos e, não nos esqueçamos de quem deu suporte à sua garra:sua esposa Zefinha. Um forte abraço , Nice Maria Pinheiro

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  5. Sempre atento a vida da cidade, Djalma e sua familia fazem parte de uma fileira de agentes de transformação histórica na nossa querida Queimados. Fico feliz de vê-lo aqui, porque nas encruzilhadas da construção da cidadania plena nos encontramos e nossas vidas se entrelação. Abraços a Djalma e sua familia.

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  6. Eloisio Mattos Gesteira, Professor de História e amigo de Djalma3 de março de 2012 às 18:12

    Fico feliz por vocês terem entrevistado Djalma, grande amigo de minha esposa Sandra Alves, que o conheceu no movimento político dentro do PT. Acredito que sua entrevista tenha um papel importante para conhecermos a História de Queimados.

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  7. Que belo trabalho...
    esta de Parabéns
    e também parabenizo pelo blog;
    abraços

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